Se a Medicina é ofício do cardiologista Rubem Ernesto Kunz, a produção de vinhos naturais começou como uma paixão e acabou se tornando também um negócio. E um negócio de sucesso, coroado, agora, com o fato de que a sua vinícola Rua do Urtigão vai representar o Brasil na Raw Wine Fair, uma das principais feiras de vinhos naturais do mundo, em Nova York.
Apesar de a vinícola estar completando 10 anos, os caminhos trilhados para chegar até aqui são bem mais antigos. Os primeiros contatos com o vinho foram pelas mãos do avô, um orquidófilo e químico, que fazia perfumes artesanais, apreciava vinhos aromáticos e chamava a atenção do neto para os diferentes aromas. Mais tarde, em tempos da faculdade de Medicina, em Porto Alegre, foi o tio com quem morou que lhe apresentou os vinhos nacionais, os franceses, os italianos e os portugueses.
Durante a residência médica, deu início, junto com um grupo de amigos, a uma espécie de confraria para estudar História e Geografia como forma de entender a tipicidade de cada vinho. Porém, ser conhecedor da bebida não era suficiente para Rubem. Ao ter contato, em 1983, com o livro “Conhecer e Trabalhar o Vinho”, de Emile Peynaud, descobriu o que iria sonhar fazer: produzir vinho.
O que começou a se realizar graças a um daqueles amigos dos tempos da residência médica, o também cardiologista Alfredo Reich, que tinha a Güntherland, 35 hectares com criação de ovelhas, parreiral e produção de suco de uvas. E foi com uvas bordô desse parreiral e uma desengaçadeira do amigo que Rubem Kutz elaborou seu primeiro vinho. Até espaço para colocar as primeiras barricas o colega também médico emprestou. Nada mais normal que, mais tarde, ao montar a sua vinícola, em Taquara, onde fixou residência, desse o nome de Rua do Urtigão, rua onde fica a Gütherland.
De lá para cá, foi só evolução. Apesar de não possuir vinhedos próprios, conhece cada um de seus fornecedores, que considera parceiros, e acompanha de perto a maturação das uvas. Na vindima, conta com a ajuda de amigos e familiares na hora de elaborar os vinhos. E com orgulho os apresenta, já figurando na carta de premiados restaurantes do centro do país.
E há muito comemorar neste aniversário de 10 anos da vinícola Rua do Urtigão: os vinhos naturais vão além de um modismo, se tornaram uma opção de uma parcela (ainda não tão grande, mas fiel) de apreciadores de vinhos mais puros, sem grandes intervenções. Mesmo que alguns critiquem o fato de esse tipo de vinho ser irregular e, pelo fato de não ter conservantes adicionados, ser mais frágil, o que importa, realmente, é que os vinhos de baixa intervenção são autênticos, exigem dos degustadores deixar de lado os pré conceitos e ensinamentos adquiridos com os ditos tradicionais, porque os naturais oferecem maiores desafios. Nada de comparar as tipicidades de castas, o principal ingrediente é o terroir.
Rubem Kunz deixou de ser apenas um apreciador de vinhos e se tornou um importante produtor dos de baixa intervenção. Foi além da elaboração da bebida de Baco, uniu o vinho com a poesia e a arte. Contou sempre com a parceria da esposa, Valéria, responsável pelas artes dos rótulos. E sempre faz questão de dividir os louros dessa caminhada, como poder comprovado no contra-rótulo de seus vinhos:
“Nesta garrafa está a seiva absorvida da terra. Nesta terra estão os aromas e sabores deste vinho. Neste vinho estão meus sonhos, as mãos, o suor e a alegria dos amigos que o elaboraram comigo”.