Todos que conheciam Ana Carolina a consideravam exigente demais. E para tudo. A casa tinha que estar extremamente limpa. As roupas organizadas por cor. Os livros dispostos nas prateleiras por tamanhos e temas. Naquela época, ainda não estava na moda ter toque. O que se dizia é que ela era chata mesmo.
Nenhuma faxineira ou empregada parava no serviço. Sempre que chegavam no apartamento, encontravam bilhetes quilométricos com as determinações das tarefas do dia. Logo, logo eram pedidos de demissão na certa. Carolina já estava acostumada e até comemorava a saída daquelas que considerava ineficientes para o trabalho. Parece que gostava de fazer ela mesma. Afinal, como diz o ditado: quem manda faz melhor.
O drama, porém, era quando convidava um pretendente para jantar em casa. Chegava a fazer croquis de onde colocaria cada objeto. O jogo americano aqui, o prato ali, esse talher é mais indicado, a taça bojuda combina melhor. O que não adiantava muito, porque insistia em mudar tudo de lugar.
Definir o cardápio, então, era só sofrimento. Fazia uma espécie de questionário interrogatório para saber o que o infeliz comia ou deixava de comer. E se o coitado dissesse “qualquer coisa”, chegava a ter urticária. Afinal, o que “qualquer coisa” quer dizer. Nada e tudo. E voltava ao ponto de partida.
Cleiton perdeu pontos de saída quando serviu espumante demais e deixou que transbordasse um leve fio sobre a toalha de mesa. Ana Carolina se segurou para não reclamar. Depois, o rapaz nem tocou no blinis com caviar e se declarou alérgico a ovas de peixe. Como assim, se não havia marcado esse problema no questionário. Ana Carolina bocejou, bocejou, mais uma vez e mais uma. E nada de ele perceber que estava na hora de ir embora. Cleiton, no entanto, se fazia de desentendido esperando passar a noite por ali mesmo. Não conseguiu. Ainda mais quando comentou que preferia cerveja ao vinho tinto que ela levara cinco horas para decidir qual servir. Cleiton foi quase escurrassado.
James Elias conhecia a fama de Ana Carolina, mas ela era bonitinha, valia o investimento. Nem chegou a entrar no apartamento. Carolina aguentava muita coisa, mas homem de bermudão e sandália com os dedões de fora em um jantar na sua casa era demais. Esse devia comer com as mãos, feito um viking.
Carlos Alberto era todo cheio de gentilezas. Puxava a cadeira, servia o espumante inclinando a taça para preservar a pérlage, elogiava cada prato que chegava à mesa, se oferecia para retirar as travessas e ainda tomava o café sem fazer um barulhinho sequer. A torta de chocolate com laranja recebeu dele dezenas de elogios. Ana Carolina estava nas nuvens. Chegou a passar por sua cabeça deixá-lo ficar por essa noite. Amanhã, ele poderia levar uma embalagem com um pedaço da torta para lembrar-se do jantar. Carlos Alberto agradeceu entusiasmado. Pediu desculpas e, meio sem graça, perguntou se o pedaço de torta destinado a ele poderia ir agora. Seu companheiro o esperava acordado. Juntos iriam tomar uma xícara de chá que harmonizaria perfeitamente com os sabores da torta.